Aristóteles para Quem Está Cansado de Filosofia de Instagram / A Trincheira Filosófica | Parte 1
Um convite para quem prefere transformar a mente a apenas decorar frases bonitas.
A morte lenta da filosofia viva
Você já deve ter visto por aí:
“Somos o que repetidamente fazemos.”
“A virtude está no meio.”
“Conhece-te a ti mesmo.”
Frases cortadas, enquadradas com alguma fonte chique, jogadas sobre um pôr-do-sol ou um feed de autoajuda.
Mas quem lê Aristóteles de verdade sabe: essas frases não são slogans. São partes cirurgicamente arrancadas de uma filosofia que exige vida inteira de prática, não 15 segundos de engajamento.
O que Aristóteles propõe está na contramão do nosso tempo.
E é exatamente por isso que precisamos lê-lo.
Aristóteles não quer que você pense bonito ele quer que você viva certo
A filosofia para ele não era um exercício de vaidade intelectual.
Era uma ferramenta de construção moral.
Ele não queria te fazer parecer sábio. Queria que você se tornasse digno.
“A finalidade da vida é a felicidade. Mas essa felicidade não é prazer, é virtude em ação.”
Só essa frase já desmonta 80% do conteúdo vendido hoje como “filosofia prática”.
Pra Aristóteles, felicidade (eudaimonia) é o florescimento pleno do ser humano, e isso só acontece quando você domina a si mesmo — e constrói, com disciplina, o seu caráter.
Mas o que fizemos com essa sabedoria?
Transformamos a filosofia em marketing pessoal.
Hoje, é mais fácil parecer que você pensa do que realmente pensar.
É mais fácil viralizar um trecho da Ética a Nicômaco do que ler o livro inteiro.
É mais confortável dizer “ninguém é perfeito” do que admitir que a virtude exige esforço.
A filosofia perdeu o corpo.
Virou texto de carrossel.
Frase de story.
Chave de bio.
O que é virtude, afinal?
Na teoria aristotélica, virtude não é espontaneidade.
Virtude é treinamento ético.
Você não nasce justo. Você se torna.
E se torna através da repetição consciente de boas ações.
“A excelência é um hábito.”
Não é um dom.
Não é uma iluminação repentina.
Não é um sentimento.
Por isso, Aristóteles defendia que a moralidade depende da phronesis — a sabedoria prática, a prudência.
Ser bom não é sentir o que é certo.
É escolher o que é certo mesmo quando não se sente vontade alguma.
A prisão do eu emocional
Vivemos hoje sob o domínio da impulsividade.
A liberdade emocional virou fetiche.
O desejo virou critério de verdade.
E o que sentimos — ou achamos que sentimos — virou justificativa para tudo.
Mas Aristóteles nos dá um tapa de realidade:
“A alma se divide em três partes: vegetativa, sensitiva e racional. A virtude acontece quando a razão domina os desejos.”
Isso quer dizer que se você quer mesmo viver bem, vai precisar contrariar seus desejos muitas vezes.
Porque ser livre não é fazer o que se quer.
É saber quando dizer “não” ao que se quer — e ainda assim se manter inteiro.
A pergunta que dói
Hoje, todo mundo quer se encontrar. Mas Aristóteles perguntaria:
“Você é alguém que está sendo formado ou apenas deformado pelos próprios impulsos?”
A maioria de nós não quer mudar de verdade.
Quer apenas parecer alguém que está no caminho.
E enquanto isso, repete os mesmos erros, os mesmos hábitos, os mesmos ciclos.
Mas Aristóteles já tinha dito:
“Somos aquilo que repetidamente fazemos.”
Por que ainda vale ler Aristóteles
Porque ele não promete transformação rápida.
Não oferece atalhos.
Não seduz com likes.
Aristóteles é brutalmente honesto ao dizer que você só será bom se agir como alguém bom por tempo suficiente.
E que, se você não fizer isso, vai viver abaixo da sua própria capacidade.
É uma porradaria intelectual
Mas talvez seja o primeiro passo para se levantar diferente.
📍 Na próxima parte da série A Trincheira Filosófica:
2. A Ética que Ninguém Segue: Aristóteles e a Virtude Esquecida (Toda Quarta as 18:00) vou postar um texto do quadro: A Trincheira Filosófica
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